quinta-feira, 4 de abril de 2013

Não te abandonarei


Madeline, apenas cinco anos, subia no colo de seu pai.
- Você já terminou de comer? - Pergunta ele.
Ela sorri e bate com a mãozinha na barriga.
- Não cabe mais nada.
- Você comeu a torta da sua avó?
- Um pedaço inteirinho!
Joe olhou para a sua mãe, que estava do outro lado da mesa; - Parece que você conseguiu alimentar todos nós. Não pense que conseguiremos fazer outra coisa esta noite além de ir para a cama.
Madeline colocou suas mãozinhas em cada lado de seu grande rosto. - Ah, papai, é noite de Natal. Você disse que poderíamos dançar.
Vovó sorriu, balançou a cabeça e começou a limpar a mesa.
- Mas, papai - contestou Madeline - sempre dançamos na noite de Natal. Só nos dois, lembra?
Então ele deu um grande sorriso que mexeu até seu grande bigode.
- É claro que me lembro, como poderia esquecer?
Assim ele colocou-se de pé, tomou-a pela mão e, por um momento, só um momento, sua esposa estava viva novamente, e os dois entravam em seu refúgio para passar a noite de Natal como tantas outras, dançando noite adentro.
Eles teriam dançado pelo resto de suas vidas; então aconteceu a gravidez inesperada e as complicações. Madeline sobreviveu. Mas sua mãe não. E Joe, o açougueiro de Minessota, foi obrigado a criar sua Madeline sozinho.
- Vamos, papai - ela balançava a mão de seu pai. - Vamos dançar antes que as pessoas comecem a chegar - ela estava certa.
Logo a campainha soaria, os parentes ocupariam os espaços livres e a noite estaria terminada.
Mas, por agora, havia somente Papai e Madeline.

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A rebeldia chegou ao mundo de Joe de forma bizarra. Guando chegou à idade permitida para dirigir, Madeline pensou ser adulta suficiente para dirigir também sua vida. E esta vida não incluía a de seu pai.
"Eu deveria ter percebido antes", diria Joe mais tarde. Ele não soube o que fazer. Ele não soube como lidar com o piercing no nariz e as camisetas apertadas. Não compreendia as noitadas e as notas baixas. E acima de tudo, ele não sabia quando falar e quando se calar.
Ela, por sua vez, já tinha tudo planejado. Sabia quando falar com seu pai - nunca. Quando ficar calada - sempre. No entanto, este comportamento era totalmente diferente com o rapaz desengonçado e tatuado da rua de baixo, e Joe sabia disso.
De jeito nenhum ele iria permitir que sua filha passasse a noite de Natal com aquele sujeito.
- Você vai ficar conosco esta noite, mocinha. Vamos jantar na casa da sua avó e comer a torta dela. Vamos ficar em família na noite de Natal.
Embora sentados à mesma mesa, eles pareciam estar em lados opostos da cidade. Madeline brincava com a comida sem dizer uma palavra sequer. Vovó tentava conversar com Joe, mas ele não estava com vontade de falar. Parte dele estava furioso; outra parte de coração partido, e o resto dele teria dado tudo para saber como falar com a garotinha que costumava sentar em seu colo.
Logo chegaram os parentes, trazendo consigo um bom final para aquele silêncio horrível. À medida que o aposento se enchia de pessoas e barulho, Joe ficava de um lado, e Madeline carrancuda, sentada do outro lado.
- Coloque uma música, Joe - lembrou um de seus irmãos. E assim ele fez. pensando que ela se sentiria honrada, ele foi ao encontro de sua filha.
- Você dançaria com seu papai esta noite?
Da forma como ela se zangou e virou, qualquer um pensaria que ele a havia insultado.
Em frente de todos os familiares, ela abriu a porta da casa e saiu a pé. Deixando seu pai sozinho.
Muito solitário.

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Madeline voltou naquela noite, mas não por muito tempo. Joe nunca a culpou por ter saído. Além do mais, como ela se sentia sendo a filha de um açougueiro? Em seus últimos dias juntos, ele tentou com todas as suas forças. Fez seu jantar favorito - ela não quis comer. Convidou-a para ir ao cinema - ela permaneceu em seu quarto. Comprou-lhe um vestido novo - ela nem mesmo agradeceu. Então, naquela manhã de primavera, ele saiu cedo para trabalhar, a fim de poder estar de volta antes que ela chegasse da escola.
Este foi o dia em que ela não mais voltou para casa.
Uma amiga disse ter visto Madeline e seu namorado na estação de ônibus. As autoridades confirmaram a compra de uma passagem para Chicago, de onde ninguém mais a encontrou.

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O garoto desajeitado e tatuado tinha um primo. Ele trabalhava no turno da noite em uma loja de conveniência no sul de Houston. Por alguns trocados por mês, ele permitia que os fugitivos ficassem em seu apartamento durante a noite, mas eram obrigados a sair durante o dia.
O que era ótimo para eles, pois tinham grandes planos. Ele seria mecânico, e Madeline só sabia que poderia conseguir um emprego em um loja de departamentos. É claro que ele nada sabia sobre carros, e ela menos ainda sobre arrumar emprego - mas não é assim que uma pessoa pensa quando está intoxicada pela liberdade.
Após algumas semanas, o primo mudou de ideia. E, no dia em que anunciou sua decisão, o namorado anunciou a dele Madeline encontrou-se enfrentando a noite sem lugar para dormir ou mão para segurar.
Esta foi a primeira de muitas noites.
Uma mulher no parque contou-lhe sobre um abrigo para mendigos próximo à ponte. Por alguns trocados ela conseguiria um prato de sopa e uma cama. Alguns trocados era tudo o que ela tinha. Ela usou sua mochila como travesseiro e a jaqueta como cobertor. Havia tanta arruaça que era impossível dormir naquele lugar. Madeline virou seu rosto para a parede e, pela primeira vez em vários dias, lembrou-se do rosto de seu pai ao dar-lhe um beijo de boa noite. Mas, quando seus olhos começaram a ficar marejados, ela recusou-se a chorar, empurrando as lembranças para o fundo de seu ser e determinando-se a não mais pensar em sua casa.
Ela tinha ido muito longe para voltar.
Na manhã seguinte a garota da cama ao lado mostrou-lhe a mão cheia de gorjetas que recebera por dançar em cima das mesas.
- Esta foi a última noite que dormi aqui - disse ela. - Agora posso morar em outro lugar. Eles me disseram que estão procurando outra moça. Você deveria vir - ela procurou em sua bolsa e tirou uma caixa de fósforos. - Este é o endereço.
O estômago de Madeline embrulhou só de pensar. Tudo o que ela fez foi murmurar.
- Vou pensar no assunto.
Ela passou o resto da semana nas ruas à procura de trabalho. Ao final da semana, quando chegou o momento de pagar sua conta no abrigo, ela colocou a mão em seu bolso e tirou a caixa de fósforos. Era tudo o que lhe sobrara.
- Não vou ficar esta noite. - disse ela ao sair pela porta.
A fome tem seus caminhos para amenizar as convicções.


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Se Madeline sabia alguma coisa, era dançar. Seu pai a havia ensinado. Agora homens da idade dele a assistiam. Ela não percebeu - nem pensou nisto. Madeline simplesmente fez seu trabalho e pegou o dinheiro.
Ela pode nunca ter pensado sobre o assunto, a não ser pelas cartas trazidas pelo primo. Todas endereçadas a ela. Todas de seu pai.
- Seu antigo namorado dever ter fofocado sobre você. Elas chegam de duas a três vezes por semana - reclamou o primo. - Dê a ele o seu endereço.
Ah, mas ela não podia fazer isso. Ele a encontraria.
Ela tampouco pensava em abrir os envelopes, pois já sabia seu conteúdo: ele queria que ela voltasse para casa. Mas se ele soubesse qual era o seu trabalho, não estaria escrevendo.
Parecia ser menos doloroso não lê-las. Assim pensou ela. Não as leu naquela semana, nem na semana seguinte, quando seu primo trouxe mais, tampouco na seguinte, quando tudo se repetiu. Ela as guardava no armário da boate, organizadas de acordo com as datas em que foram postadas. Ela corria os dedos pelas bordas de todas elas, mas não conseguia abrir uma sequer.
Durante a maioria dos dias, Madeline conseguia entorpecer suas emoções. Pensamentos de sua casa e pensamentos de vergonha caíam juntos no mesmo lugar em seu coração. Mas havia momentos em que seus pensamentos eram muito fortes para resistir.
Como no dia em que ela viu um vestido na vitrine de uma loja, da mesma cor que seu pai havia lhe dado. Um vestido muito simples para ela. Com muita relutância ela o vestiu e ficou em frente ao espelho, ao lado de seu pai.
- Mas você está quase da minha altura - disse ele.
Ela havia se esquivado ao seu toque. Notando sua face abatida refletida na vitrine da loja, Madeline percebeu que daria mil vestidos para sentir seus braços novamente. Ela saiu da loja e resolveu não passar mais por ali.
No momento certo as folhas caem e a temperatura abaixa. O correio chegou, o primo reclamou e o estoque de cartas cresceu. Ainda assim ela se recusava a mandar-lhe seu endereço, como também a ler as cartas.
Então, alguns dias antes da noite de Natal, outra carta chegou. Mesmo tamanho, mesma cor. mas esta não tinha o selo do correio. E não havia sido entregue por seu primo. Havia sido colocada em sua penteadeira.
- Há alguns dias um homem grande passou por aqui e pediu que eu entregasse isto a você. - explicou uma das outras dançarinas. - Disse que você iria entender a mensagem.
- Ele esteve aqui? - perguntou ela ansiosa.
A mulher levantou os ombros.
- Suponho que sim.
Madeline engoliu a seco e olhou para o envelope. Ela o abriu e removeu o cartão. "Sei onde você está", lia -se, "sei o que você faz. Isto não muda o que sinto. O que eu disse nas outras cartas ainda é verdadeiro".
- Mas eu não sei o que você disse - declarou Madeline. Ela pegou uma carta do topo da pilha e leu. Então a segunda e a terceira. Cada uma delas possuía a mesma frase. Cada sentença fazia a mesma pergunta.
Em questão de segundos o chão estava coberto de papéis e seu rosto em lágrimas.
Após uma hora ela estava no ônibus. "Tenho que chegar a tempo." 
Os parentes estavam começando a sair. Joe estava ajudando a vovó na cozinha, quando seu irmão o chamou do subitamente silencioso aposento.
- Joe, tem alguém aqui que quer vê-lo.
Joe saiu da cozinha e parou. Em uma mão a moça carregava uma mochila, na outra um cartão. Joe viu a pergunta em seu olhos.
- A resposta é sim - disse ela ao pai. - Se o convite ainda estiver de pé, a resposta é sim.
Joe mal podia acreditar.
- Oh, meu convite está de pé!
Então os dois dançaram novamente na noite de Natal.
No chão, próximo à porta, havia uma carta com o nome de Madeline e a pergunta de seu pai.
"Você viria para casa e dançaria novamente com seu papai?"

Deus só está esperando a nossa resposta!

 Autor - Max Lucado
Livro - Ele escolheu os cravos




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